Por: Nigel Thurlow
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ENTREVISTA - O chefe do movimento ágil da Toyota Connected nos fala sobre a jornada de agilidade da Toyota e explica por que a divisão entre o pensamento lean e o movimento ágil não tem motivos para existir.
Roberto Priolo: Você pode apresentar brevemente a Toyota Connected ao nosso público?
Nigel Thurlow: A Toyota Connected foi criada como uma startup ágil para ajudar a Toyota a responder rapidamente às mudanças na tecnologia de carros conectados. Não estamos falando apenas de carros autoconscientes, mas de fornecer uma ampla gama de serviços conectados aos proprietários de veículos para atender às suas necessidades de mobilidade. Essa é a visão do presidente da Toyota, Akio Toyoda, que tentamos executar alavancando todas as ferramentas digitais à nossa disposição, da inteligência artificial à internet das coisas. Somos uma afiliada da Toyota Connected no Japão, criada por Shigeki Tomoyama, presidente da Toyota Connected, a pedido do próprio Akio Toyoda, originalmente para examinar as capacidades de dados de veículos conectados e o que poderíamos fazer com todas as informações que nossos veículos nos enviam para tornar a condução mais segura, mais conveniente e mais divertida.
RP: A Toyota está em uma jornada ágil há quase dois anos. Você pode por favor colocar isso em contexto e compartilhar algumas das coisas que a empresa está fazendo para aumentar sua agilidade?
NT: Antes de mais nada, deixe-me dizer que o que muitas pessoas chamam de “transformação ágil” é, na verdade, uma transformação organizacional para nos permitir sermos mais ágeis, e o scrum é uma das abordagens pelas quais estamos conseguindo isso. A Toyota Motor North America, nossa empresa irmã, iniciou sua jornada ágil na sua divisão de TI de 5.000 unidades porque queria agregar valor aos nossos clientes internos e externos mais rapidamente, a um custo menor e com maior qualidade. Ágil é uma abordagem empírica que estamos usando para resolver problemas complexos. Naturalmente, ainda estamos totalmente enraizados no Sistema Toyota de Produção (STP) e nos valores que definem o modelo Toyota, mas também reconhecemos a necessidade de melhorar nossa capacidade de fornecer soluções melhores e de menor custo mais rapidamente e de nos adaptarmos às mudanças nas expectativas do cliente.
Desde os primeiros dias, crescemos significativamente, começando a fornecer soluções de software para mobilidade. Temos muitos projetos em andamento, desde o Google Apps até o serviço de compartilhamento de carros Hui em Honolulu, em parceria com a Servco Pacific Inc, desde a integração da Alexa da Amazon na Toyota até o estudo da ciência de dados e inteligência artificial. Praticamos e ensinamos os princípios do STP e da Toyota Way, mas também somos uma empresa ágil: as nossas pequenas equipes colaborativas sentam-se juntas em escritórios com espaço aberto, salas obeya, quadros visuais e andons ao redor.
Estamos definindo o que agilidade significa para a Toyota enquanto corporação global. Temos tomado muito conhecimento do setor e estamos dando retorno à comunidade tentando encontrar sinergias entre o STP/lean e o mundo ágil. Recentemente, lançamos uma oferta pública chamada scrum, a Toyota Way, por exemplo. Continuamos a aprender coisas novas e evoluímos à medida que nossa compreensão desse mundo se aprofunda.
RP: Muitas organizações parecem se esforçar para abraçar o mundo digital. O que a Toyota tem que a ajuda a aproveitar as oportunidades oferecidas pela tecnologia digital?
NT: Seu DNA! Todos na Toyota compreendem a promessa cliente em primeiro lugar e os princípios básicos do STP e da Toyota Way. Quando discutimos o valor de adotar novas tecnologias e o mundo digital, sempre temos nosso DNA nos dando as razões pelas quais precisamos fazê-lo: nossos clientes. Outras empresas muitas vezes são movidas por outros motivos, colocando os acionistas e o lucro antes do cliente, o que, é claro, cria enormes desafios quando se trata de tentar mudar a situação. Mesmo quando estão tentando se tornar lean, eles se concentram mais na utilização de recursos do que em gerar fluxo de valor. Na Toyota, estamos muito conscientes de que o foco em entregar valor aos clientes por meio de nossa transformação faz com que tudo se encaixe.
Nossa indústria precisa reconhecer que, se eles não puderem se tornar mais ágeis, eles terão dificuldades para se manter competitivos. Ter uma abordagem ágil nos dá uma maneira melhor e mais rápida de fornecer valor aos clientes, considerando a tecnologia e as metodologias disponíveis para nós hoje. Precisamos ser capazes de tomar decisões mais rápidas, fazer entregas mais rapidamente e permanecer competitivos em um mercado em constante mudança (custo, qualidade e entrega - tudo se resume a isso, na verdade). Além disso, e onde lean e ágil se reúnem novamente, quando você começa a trabalhar de forma transparente, o desperdício se torna incrivelmente fácil de enxergar e, portanto, de eliminar.
RP: Muito pode ser dito sobre a relação entre lean e ágil, com as duas comunidades frequentemente se olhando desconfiadas. O que você acha disso?
NT: Este é um mundo pequeno. Leia o Manifesto Ágil, escrito em 2001 para codificar um conjunto de valores e práticas, e você encontrará muito pensamento lean nele. O scrum - a estrutura predominante da agilidade - foi baseado na Toyota (e no que todo mundo chama de “lean”) e nos princípios da DuPont e nada mais é do que o PDCA codificado. Quanto tempo se deve usar para planejar, fazer, verificar e agir? E o que realmente está acontecendo em cada uma dessas fases? O scrum lhe diz tudo isso, provendo disciplina em torno do PDCA. Olhando para trás na NUMMI, John Shook disse uma vez: “Para mudar uma cultura, primeiro você precisa mudar o comportamento”. O que estamos fazendo na Toyota é usar o scrum como uma estrutura comportamental para executar ciclos mais rápidos de PDCA. Outro exemplo da grande compatibilidade entre esses dois mundos, que atualmente estamos estudando em profundidade, é o papel do dono do produto no scrum, que é exatamente o mesmo do engenheiro-chefe na Toyota!
Não há dúvida de que o lean está profundamente enraizado em nossas crenças enquanto pensadores ágeis. Na verdade, o lean é a raiz de todas as abordagens e técnicas ágeis. Mas o que precisamos entender primeiro é que o ágil não está salvando o lean, e o lean não está salvando o ágil: o movimento ágil está permitindo que empresas que já são lean ou que desejam ser lean tomem decisões mais rapidamente. Estamos usando bases como o scrum e ferramentas que saem do Sistema Toyota de Produção para permitir agilidade nos negócios, desenvolvendo assim a capacidade de responder mais rapidamente às tendências do mercado. “Agilidade não é o objetivo. É um resultado", sempre dizemos. A verdade é que você não faz ágil (assim como você não faz lean); você se torna ágil seguindo várias práticas e técnicas.
Existe uma grande sinergia entre ágil e lean. A ironia é que um é baseado no outro, mas quando você começar a ficar mais ágil, você se tornará mais lean com mais facilidade.
Nigel Thurlow é o chefe do movimento ágil na Toyota Connected.
Fonte em português: Lean Institute Brasil.
Fonte em inglês: Planet Lean.
Data da publicação:
02/08/2018
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Nigel Thurlow
Toyota
É o chefe do movimento ágil na Toyota Connected.